RUMOS
Alberto Oliva
Luis Alberto Cerqueira
Silvio Witlin
Edição Dos Autores 1975
*
RUMOS
é fruto da amizade. Da amizade entre os autores, e, veio parar em minhas mãos, também pela amizade, amizade entre aluno e professor, quando em 1978, cursando direito na UFF, reencontrei meu professor de história no 3º ano do 2º grau, Prof. João, numa passeata pela Av. Almirante Barroso, centro da cidade do Rio de Janeiro, ele já policial federal, acumulando dois empregos, e saimos para tomar um cafezinho, deixando os curiosos mortos de nervosismo por verem um manifestante cheio de broches do Comitê Brasileiro Pela Anistia, conversando e abraçando, amistosamente, um policial federal, ainda no clima de ditadura militar em que vivíamos.
Conversa vai conversa vem, ele abriu a tiracolo e mostrou-me RUMOS, falou sobre os autores, todos seus amigos, e disse que eu teria bons momentos lendo-o. e ofertou-me o livro. Voltei para passeata, já chegando no Teatro Municipal e reuni alguns amigos para lermos poesia sentados nas escadarias da Câmara Municipal. Findos os discursos de praxe, nos acomodamos no Bar Amarelinho, point da militância política à época, tomamos alguns chopes e partimos.
Mas crônicas à parte, vamos ao que interessa. Quero deixar-lhes uma amostra da poesia dos autores e começo por:
1 - Alberto Oliva:
Só uma criança
só uma criança pode fazer versos
só uma criança brinca por brincar
só uma criança sabe o que é um brinquedo quebrado
Há uma criança dentro do meu verso
há uma criança que conserta as letras partidas das palavras
há uma esperança dentro da palavra criança.
*
Divisei sua persona
fui andando nessa direção
lá pela divisa do beijo
metade do seu rosto ficou no meu
a outra metade só consigo ver
quando sozinho cismo à frente do espelho
*
Na palma da mão
inda hão de surgir
novas coisas escritas
mensagens não ditas
entre tantas veredas
tem a trilha do corpo
sempre de súbito lembrada
quando você abre caminho
cava e cimenta carinho
no meio de braços fundos
limites de dois mundos
chamados eu e você.
*
Ontem
por dentro da noite
houve tanto silêncio
que eu gritei
como por instinto
como fogo extinto.
2- Luis Alberto Cerqueira
Crio
no tempo um novo espaço
e no espaço um vazio
Salto
sem dimensão, ao largo
e para cima, alto
Faço
do visível o abstrato
e junto eu me desfaço
*
Da janela
estendida a mão
rompe o segredo e o mistério
da comunicação:
lá e aqui
estamos no mesmo lugar.
*
Já fiz tudo
que podia
Não me iludo
Se foi pouco
mais não posso
Não sou louco
Não há meta
no meu passo
Que sou poeta
Jogo fora
meu papel
Vou-me embora
3 - Silvio Witlin
Cinco manhãs
contido,
escondido
na carne
de um bairro
chamado Ingá.
Cinco manhãs
eu sendo
meu cúmplice
a me fazer
desandar.
Cinco vezes
o coração
não sabe
onde vai dar.
*
Meu corpo
a leste do teu corpo.
Vou fazer-te uma visita,
ultrapassar a fronteira
e encontrar logo na beira
um desejo tão Maria...
*
Enquanto
o silêncio
falar
mais alto
e calar,
terão
nas cáries
bons
esconderijos
as palavras
e ruídos
que eu queria
lançar no ar
que dança
ao redor
dos teus
ouvidos.
***
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