terça-feira, 31 de março de 2015

Francisco Roberto Vieira, Poeta * Antonio Cabral Filho - Rj

O professor Francisco Roberto Vieira não deixou-me DADOS, para que eu pudesse falar sobre ele para a posteridade. Mas como pode ser visto acima, ele editou a folha literária CARTA POÉTICA, março de 1997, não sei até quando, porque perdemos contato em torno do ano 2000, mas o livro estampado na foto foi impresso por mim e foi o presente de natal que ele deu aos amigos em dezembro de 1996.                             
                                   Fora isso, o Professor Francisco, ou Chico, para os amigos, circulava em muitos fanzines de poesia, como o meu CURUPIRA, ou jornal e revista dos movimentos sociais, fosse indígena, sem-terra ou sindical.  No caso dos movimentos indígenas, ele protagonizou a criação de uma entidade de apoio à causa indígena, o COMITÊ DE APOIO À CAUSA INDÍGENA - CACI, junto com outro gigante do ativismo social da UFF, o Professor Habauna Baumaster; juntos, eles pegavam as mochilas e rachavam para o Xingu; voltavam consagrados pelas reportagens que faziam sobre todo tipo de demanda envolvendo os índios, sobretudo, a presença religiosa branca, tanto católica como protestante, as quais eles "denunciavam!"
Mas a sua atuação poética é que me interessa. Temos acima a foto do livro ANTOLOGIA POÉTICA VOL2 - UFF/EDUFF 1996, da qual eu participo, e creio que ele integrasse outras edições, o que não consegui levantar. No entanto, toda a sua produção poética do meu conhecimento será mostrada aqui.
Nesta ANTOLOGIA, ele participa com o poema " ESTADO DO ESPELHO:
Feio e bonito
me revelas por partes.
Em repentinos lampejos
mais belas
ou em momentos duradouros,
mais insondáveis.

Então me vejo
de tantas faces de mim mesmo assim vestido,
e com que máscaras sobre máscaras assustadoras,
me disfarço.

Em espelhos de casa dos risos,
já me peguei a gargalhar da sorte,
de minha própria imagem contorcida,
em palhaço.

Vem-me um outro agora,
e novamente,
com esse semblante lindo.
Seria o semblante da morte?

Veio-me então, minha alma,
tão plenamente,
na limpidez de sua face;
e nos reflexos dessas águas de lágrimas,
tão pláscidos."
***
Do livro

REFLEXOS
RE
FLEXOS

segue-se
SENTIMENTO

Sentia tanta saudade de você!
Mas que saudade da saudade que sentia de você!
Sentia saudade daquela saudade.
Que era saudade mesmo de quê?
E agora sem nenhuma dor,
Sinto só saudade:
Vaga saudade...
Sinto muito amor.
***
FORA DE MIM

Pensei em ir talvez lá fora.
Quem sabe, encontre alguém.
Mas para que é que eu vou lá fora,
Lá fora não há ninguém.
*** 
CANDELÁRIA

E agora
só escutas a sucessão dos tiros,
inúteis tiros.
- Que já não são mais para mim,
hás de pensar.
- Talvez atire na própria morte.
Pensas:
Na morte dos meus poucos anos.
***
ARCA DE NOÉ

Como aquela arca.
Guardo em mim todos os seres
e todas as coisas.
Sou o que anseia tudo
e a tudo conter.

Ser o íntimo de cada tom, de cada cor,
e ainda, de cada cintilar sutil das pedras

Trazer em minh'alma todos os afagos,
e a totalidade dos desejos saciados.
Pelo amor.

E tudo isso ainda é pouco.
Sou arca imensa e inesgotável,
quero ainda ter aquela ave
desfalecida em minhas mãos meninas,
e com as mesmas mãos,
acarinhar todas as rugas e dores já sentidas,
para finalmente derramar todas as lágrimas
de todas as legítimas emoções quiçá vividas.
***
REPULSA

Sem querer
rocei no cabelo dela
e senti sua rejeição.
Nojo de gente, pensei.
Tomara que morra sozinha,
sem ter quem lhe penteie os cabelos,
ou lhe venha escovar os dentes
***
VIDA E MORTE

Cortas como faca o vento,
procurando a vida
Insistentemente.
Rasgo como navalha o tempo,
fugindo da morte,
inutilmente.
***
A GIORDANO BRUNO

A "ciência proclamada,
não estancou ainda o cutelo da divisão".
Muito ao contrário, Giordano,
foi exacerbada a dispersão.
Com plena liberdade,
já é lícito pensar filosofia,
mas como ontem,
continua a inquisição.
E ainda é 
o maior inimigo do humano
o Homem.
Que continua a lamentação,
como um infeliz GIORDANO.
***
MEU POEMA

Meu poema,
não é aquilo,
que tento tanto escrever.
O meu poema,
já está escrito,
pois ele é sempre você.
***
AO PEQUENO BOIADEIRO

Como crina orvalhada,
teus cabelos,
meu pequeno boiadeiro.

No aboio da madrugada,
te conhece pelo nome,
cada animal,
meu pequeno boiadeiro.

Ê mimoso, ê malhada...
teu grito me acordou mais cedo,
meu pequeno boiadeiro,
que conhece pelo nome,
acada animal da boiada.
***
MEU VERSO

Meu verso,
é dizer nos entre-versos
o que nunca revelei
do meu tão grande segredo
que se esconde até de mim.

É procura que não acha,
está sempre faltando um dado,
teorema não demonstrado,
namoro que nunca se casa.

Buscando a razão da razão,
e a poesia da poesia,
é um pranto que não cessa,
é festa que não acaba.

Quase mudo,
da rima já se perdeu,
pra tentar a precisão,
e foi ficando sem nada,
pra poder falar de tudo.

De tantas voltas no mundo,
já virou minha cabeça,
rebelou-se contra todos,
e até mesmo contra mim,
para poder dizer do todo,
que ele é fogo e é água,
que é terra e é amor,
é que ele ficou assim.

Meu verso,
se vai, não fica. 
É apenas um perfume,
que se esvai logo que sinto,
meu verso...
Nem mesmo eu sei,
o que ele significa.
***
A POESIA

Como bálsamo que a dor aumenta,
perfumando a alma,
silêncio feito de palavras,
para espreitar as ideias,
e os sentimentos.

Na arte preparo o bote,
sabendo que sou a caça;
é o texto de um testamento
ciente que sou moribundo,
se eu me chamo Raimundo,
ou se me chamo Rosa,
ou se por outro nome me chamo...
Que me importa que nome tenho,
se todo nome é de poeta?
***
ÁRVORES NOTURNAS

É possível que mil tons
de sombras
se completem numa unidade,
de paz.
Numa síntese de beleza,
de um complexíssimo fractal.
E são as árvores noturnas,
que me revelam um segredo:
Os dinossauros se extinguiram 
porque eram feios;
a estética é a lei,
afinal.
***
PRETÉRITO

Há mistérios,
nas casas abandonadas.
Há mistérios,
nos velhos livros esquecidos,
há mistérios...
Histórias minhas em recantos,
onde nunca estive;
histórias minhas em páginas rasgadas,
que nunca escrevi, nem li.
Pedaços de mim
que há milênios se perderam.
Pedaços que, como fantasmas,
de mim se esconderam.

Tantas vezes morri!
E os vestígios
que ficaram 
nas antiguidades,
os escondi.
***
ARQUEOLOGIA POÉTICA

Faço-a das sobras,
dos detalhes negligenciados,
pelos distraídos,
pelos apressados .
Arqueologia dos gestos,
de uma dança casual,
no limiar entre o selvagem e o civilizado.

Entre o conflito e a paz
procuro o belo no feio,
e o significado no não-senso,

pois sei que é bela,
pois sei que é a vida.
E a encontro no acaso,
(Finalmente!)
dos momentos esquecidos,
quando se desnuda,
displicentemente.
***
VELHAS ÁRVORES

... e escureceu o céu da tarde.
Cor de temporal.
Pressa de temporal,
cheiro bom de temporal,
brisa que avisa
o temporal.

Tocam-se as folhas suavemente,
e os galhos velhos e os novos.
Vão-se os anciãos em sussurros,
e as crianças com algazarra,
antes da hora.

- Hoje se vão mais cedo.
- Podemos dormir mais cedo.
E as velhas árvores trocam intimidades,
e os segredos da vida e da morte.
Disfarçando suas falas,
nos sons do vento,
do temporal.
***
AS VELHAS

Falam-se simultaneamente,
balbuciando em coro,
em todas as solenes tardes,
como em ritual.

Tramam nossos destinos,
tecem o tricô,
e o futuro do mundo,
como pitonisas.

Que astuciam,
com tão simples alegria,
aquelas velhas do parque,
todos os dias?
***
LIÇÃO VEGETAL

Preciso aprender,
a aprender com os vegetais,
a verdadeira vida,
A verdadeira paz.
A sentir o sabor do cotidiano,
e com naturalidade,
a crescer buscando a luz,
(Busca incessante!)
A buscar sem ansiedade,
encontrando e construindo,
sem pressa, dia a dia,
uma nova estética.
E implacável,
que a si mesma se completa,
simultaneamente simples e complexa.
Absolutamente inédita.
E quanto à morte, caminhar sem zelos,
aprendendo que viver,
essencialmente,
é fazer-se e ao mundo,
cada vez mais belos.
***
É SEMPRE ASSIM

É sempre assim,
o nosso amor é inconstante como a vida,
parece gente,
tem humor, tem despedida,
agora é não, para depois dizer que sim.

É sempre assim,
o nosso amor é infinito, mas acaba,
depois que volta,
é mais gostoso, é mais fogoso,
é mais fiel, é como o mel, é mais afim.

E afinal,
quem pode compreender essa loucura?
De que lugar é que nos vem essa ternura?
que me preenche e ao mesmo tempo me esvazia?

É que o amor é certamente uma procura,
é que o amor é um achar que não acaba,
o amor é luz, o amor é dor,
é a poesia.
***
CONTRAMÃO

Levando cada um
a sua dor,
os carros passam sempre,
na mesma direção.
A dor tem pressa, 
não se sabe de que,
mas a dor tem pressa.
Talvez pressa de passar,
ou pressa de crescer

A via expressa
é corredor interminável,
por onde passam as dores que não passam,
eu as contemplo,
e eu medito,
a minha própria dor,
mas afinal, que dor é essa,
que não passa?
***
ALEGRIA

Hoje bem cedo,
encontrei na padaria,
um sorriso,
um doce sorriso,
daquela mais pura alegria.
Era um sorriso franco,
com uma pintinha no canto,
do rosto.
Indaguei-me,
de que seria feita,
aquela tão pura alegria?
Do orvalho da manhã?

E um suspiro doce,
desses que se desmancha na boca,
e num instante se acaba,
feito de clara e de açúcar,
me revelou a receita:
dizendo lá da vitrine,
que ela é feita de nada.
***
NA PRAIA

Fantasia.
Quisera ver teu corpo,
inteiramente nu,
e integralmente,
a passear pela praia.
Completamente iluminado,
pelos refletores do sol de alguma manhã.
Detalhadamente.
Numa praia tão pura,
como hás de a mim parecer,
sereia,
e em tal poema.
Ver,
quisera o movimento,
de cada curva tua,
desde as pegadas,
que deixares na úmida areia,
como úmidos meus olhos,
de tanta e tamanha alegria.
***
POS MODERNO

Computador, não rima com dor,
tomografia, não rima com alegria.
Então com que eu vou rimar amar?
Rimar por rimar? Ritmar por ritmar?

Mas embora,
tenham-se ido as varandas,
e as canções,
e as cirandas,
e mandem que eu me cale,
ainda vejo velhos e crianças.
Trabalhadores inocentes,
e meninas que pedem,
uma boneca que não fale.

E conheço também um menino,
que sonha em ser bombeiro.

E se a rima é difícil
é que não me acostumei,
com todo este meu mundo,
que por mim passa tão ligeiro.

Talvez assim seja melhor,
de ver a rima que há,
passa por nós a mil,
dentro do metrô.
***
RELIGIÃO

Não gosto desse teu Deus,
que ao contrário de ser onipotente,
muito pelo contrário,
é a ti tão obediente,
é um Deus que não te fala,
muito ao contrário,
só te escuta.
É um Deus que só de ti tem pena,
e a mim,
muito ao contrário,
só me condena.

Um Deus assim,
com tantas regras,
e tantas leis a cumprir,
todas ditadas por ti,
não é um Deus,
muito ao contrário,
é um escravo.
***
PALAVRA

Fala-se pouco,
enfraquecida a oralidade,
ninguém ouve, ninguém fala,
nesta cidade.
Corredor branco de um hospital,
de loucos.
Cheio de sinais,
as paredes são assepticas.
Os corpos são assepticos.
As relações são assepticas.
Higieniza-se cada palavra,
transformada agora em marca.
***
CIDADELA
A Manoel Dumnã

Como a ti, menino índio,
que ainda vejo ouvindo o Tocantins,
esperando os amigos na beira das águas,
com tanta fidelidade.

Canto a ti, índio menino,
de tanta beleza,
deixando que o rio te molhe os pés,
mas impermeável à maldade.
Completamente impermeável.
Como um banco genético,
do que chamamos humanidade.
Cidadela indomável,
guardando as matrizes
da nossa ameaçada natureza humana.
***
ANJO
Para a Filha do Robson

Conheço uma menina
que é um anjo,
infiltrado entre nós.
Teima em não ser gente comum,
tão delicada,
tão bela,
como aquelas pequeninas
flores do campo,
aquelas menorzinhas.

Um anjo disfarçado é ela,
tem um radinho escondido
e quando todos distraidos
estão assistindo a novela,
ela manda suas mensagens,
mensagens secretas pro céu.
***
POLITICAGEM

Não, não é por acaso,
que os políticos são tão ruins
e em geral tão imundos.
É que Deus entregou de fato
e ao diabo
o poder sobre este mundo.
***
MIRIAM

Por um descuido de Deus,
que Deus também se descuida,
caiu um anjo do céu,
e bem aqui em nossa casa.

Ou será que foi capricho,
que Deus também tem seus caprichos,
que bem aqui em nossa casa,
caiu um anjo do céu?
***
DUALIDADE

Abre o sinal,
não sei se vou
não sei se paro.

Desejo o sol,
aspiro a noite,
fico indeciso.

Olhando o outro,
não sei se amo,
não sei se odeio.

E cada momento,
pede uma opção:
Não existe o meio.

Quando me erram,
não sei se perdôo,
não sei se maldigo.

E todo apelo,
tem duas faces,
um sim e um não.

Faz-se a pergunta,
não sei se calo,
não sei se explico.

Se me divido,
a cada instante,
da minha vida.

E enfim, na ação,
ou na palavra,
eu me unifico.

Após findar o livro, passo agora À CARTA POÉTICA nº1 de março de 1997, com o poema MOVIMENTO:

Rola a bola
roda o tempo
sopra o vento
sobe a pipa
morre o velho
nasce um novo
vem a onda
vai-se o dia
dorme o sol
acorda a fantasia
passa uma estrela
fica um desejo
sinto um pensa-
mento,
pinto uma poesia.
***

Temos a seguir a última colaboração do Chico no meu CURUPIRA nº8, de julho de 1997, com um poema falando da privatização da VALE, intitulado SONETO AO QUASE FIM DA PÁTRIA:
Pátria, palavra no tempo esquecida,
tanto se fez, tanto se faz, que agora,
não restou quase nada do que outrora,
um dia, foi minha pátria tão querida.

Quanto VALE este chão todo encharcado?
(Sangue e suor de tantos brasileiros!)
A mãe dos índios, seus filhos primeiros?
Quanto VALE enfim, este chão dourado?

Um Silvério traiu Tiradentes,
morto por nossos minérios defender,
nossa soberania e liberdade.

Mas Silvério deixou seus descendentes,
sem-pátrias que da Mãe querem vender,
desde às entranhas à dignidade.
***

Aqui, o Chico sumiu. Ou seja, o Professor Francisco Roberto Vieira afastou-se da universidade; eu saí de lá em 2000 e, pouco depois, perambulando pelo Campus da Uff, soube que ele havia falecido....

FICAM A HOMENAGEM SINCERA E O REGISTRO DA SUA OBRA COLHIDA PELO AMIGO DE LONGOS ANOS DE CONVIVÊNCIA, Antonio Cabral Filho
***************************************************************

terça-feira, 24 de março de 2015

Alfredo Chlamtac Filho - Itaboraí-Rj

Primeiro, quero dizer que falar dos amigos é sempre difícil; falar dos  amigos com os quais concordamos também é difícil, mas falar dos amigos dos quais discordamos e mesmo assim conseguimos ser amigos, esses, são especiais. é  o caso do ALFREDO CHLAMTAC FILHO. Sempre "batemos de frente" nas opiniões, mas na hora das "DIRETAS JÁ!" nós estávamos ombro a ombro de faixa na mão; na hora da CONSTITUINTE ídem; na hora do "LULA LÁ!" também e o mais interessante é que tínhamos "leituras" discordantes sobre as mesmas coisas. Aí ele me acusava de "IMEDIATISTA", dizendo que eu só queria ver como seria um operário presidente, que eu só queria a democracia, que eu não era MARXISTA, e que ele queria o SOCIALISMO e que até lá.... TUDO É TÁTICO. Eu concordava, mas ele retrucava dizendo que dispensava o meu apoio, uma vez que o meu método de luta era só LEGAL e não REVOLUCIONÁRIO. Impaciente, com a cabeça cheia de "teorréias ", mandava ele sentar no método revolucionário...


Segundo, quero falar sobre a poesia do meu amigo, pois através dela, aprendi muito do que acredito ser atualmente, ou seja, um homem com visão cada vez mais ampla dos problemas humanos e que não acredita mais nas " ações diretas já!", pois se a solução fosse ir alí na esquina e matar alguém que EU responsabilize pelas desgraças do mundo, tudo estaria resolvido;  mas não está e o pior é isso... Mas foi pela convivência com pessoas como Alfredo e Pedro Giusti que eu fui "descobrindo as coisas", a despeito de dezenas de livros lidos e debates debatidos...

Mas eu não conheço nada melhor para  mostrar quem somos nós do que um texto, um desenho, uma música, enfim, algo que vem do nosso subconsciente, como a poesia... E o primeiro texto que eu conheço do ALFREDO é "  CARTA SEM DESTINO , com a seguinte epígrafe (... metrificando assim meu verso marginal de perseguido  /  que vai cair baldio num terreno abandonado. trecho do poema de Afonso Romano de Santana, Rainer Maria Rilke e eu).

Uns textos restritos pelas duras condições de existir organicamente dos autores, quer dizer assim:  a revista existe, depois de cinco anos de um parto, projeto de edição, algo novo, inusitado, além parâmetros comuns, alguma coisa que extrapola, que salta os muros, que rompe as barreiras no sentido da autodescolonização dos sentidos, está assim pois no âmago da questão de forma incontestável.

Enquanto isso, na mesa dum editor bem no bum  permanente da literatura importada, muitos autores estrangeiros da moda na moda  sempre rendosa das traduções  que fazem as caixas  registradoras funcionarem  e as cabeças ficarem domesticadas. 

Dinheiro, dinheiro, dinheiro, a mola que mexe a caldeira do diabo, que fomenta as reputações, as guerras e as desesperações dos verdadeiros artistas ( almas videntes deslocadas  no além-mundo , onde vale tanto a folha que cai da árvore  como um pedaço de papel  onde está pintada a cara de um personagem e um número de valor.).

Fazer a revistas poética ( FEIRA ) , pretensão de ser testemunha  de uma geração  cortada na raiz, uma explosão de criatividade, afinidade aos mestres e à vida.

Abre-se uma perspectiva para quem deseja  lá chegar um dia, ou seja, ver em caracteres impressos... não assim não; Artaud disse... não assim também não; seriedade cara, discurso lógico, a-emoção, fora da luz não, olha o enquadramento, cuidado com o foco narrativo.

Uns autores, uns mosquitos, umas moscas, uns originais sobre a mesa, retrato de ANA C. olhando linda , perguntando do porque da morte  pra ver sair um livro publicado. Indagando: até quando há de ser assim?

Não, assim não; bem, bom, uns editores, uns leitores especiais que analisam os textos e adquirem os mais significantes e evolutivos  criadores do fazer  literário de agora, os que tentam ocupar o vácuo deixado pela cassação ( caçação ) e perseguição da inteligência nacional executada cientificamente nas duas últimas décadas.

Em função disso, na mesa daquele editor, bem no bum da literatura estrangeira, mais uma tradução rendosa ( do METAMORFOSE de Franz Kafka existem três ou mais ) pra ser despejada no mercado, várias tiragens de muitos mis exemplares, garantido retorno de capital na capital do eixo cultural do país.

Modernos tempos do DAS CAPITAL.

Sabe de uma coisa, deixa isso pra lá de literatura figura, de testemunho das futuras gerações, vá plantar batatas no quintal da sua casa e esqueça as vanguardas ali onde possivelmente jazem sem fronteiras e vá plantar mamão com a mão que redige as linhas; linhas e mais linhas sem as luzes dos " clássicos " com seus traseiros de bronze e que vão sendo traduzidos e publicados, vendidos/comprados em todas as ´principais cidades do país por/para  uma multidão de leitores  bisonhos que garantem a marginalização dos possíveis novos talentos, assim como garantem a dominação cultural no plano literário neste nosso "patriarcado" bíblico como disse Graciliano Ramos.

ANA C. olha-me através das lentes dos óculos; acabo de levantar os olhos do papel e vejo a lua cheia atras das folhas do coqueiro. Choro. Alfredo Chlamtac Filho. "

O texto acima é do período 1980/1981, época em que POETAS ALTERNATIVOS, POETAS MARGINAIS, enfim, a MARGINÁLIA LITERÁRIA em geral juntou-se e produziu uma FEIRA LITERARIA na CINELÂNDIA, que foi durante uns dois anos  o PROGRAMA CULTURAL da juventude que iria engrossar as passeatas ao som de LEGIÃO URBANA...


*&*

***
TREM DA CENTRAL

Cartazes gigantes
fazendo apelos
publicitários
aos corações.
Nos bolsos dos passantes
um vazio progride
desesperado.
Anuncio de tempestade
produzida pelas nuvens
da falta geral
nas barrigas roncantes
que atravessam subúrbios
para ir aos trabalhos
num trem da central.

*&*

quinta-feira, 5 de março de 2015

Notícias de Diamantino Ferreira * Antonio Cabral Filho - RJ

DIAMANTINO FERREIRA 
Campos dos Goytacazes - RJ
ASTROS E ESTROS
http://www.veraviana.com.br/astroseestros.html
*
NAVEGANDO NAS POESIAS
http://navegandonaspoesias.blogspot.com.br/
*
CAMPISTANA
http://campistana.blogspot.com.br/
*
BLOG DO TROVARIO
http://acf1308.blogspot.com.br/2014/01/da-exuberancia-da-trova-diamantino.html
*

domingo, 1 de março de 2015

IVERSON CARNEIRO / MARTELO CARIOCA / NITERÓI * Antonio Cabral Filho - RJ

IVERSON CARNEIRO
BLOG DO MOLEQUE VELHO
http://blogdomolequevelho.blogspot.com.br/2009/02/iverson-carneiro-cantador-brasileiro.html
*
FACEBOOK IVERSON CARNEIRO
https://www.facebook.com/iverson.carneiro
*
ACERVO DA GRAFIA
http://acervodagraphia.wordpress.com/category/iverson-carneiro/
*
MARTELO CARIOCA
I
Neste inverno de julho prazenteiro,
vejo o Rio lacerado mas contente,
vejo a força e a alegria de sua gente
e a certeza de um novo janeiro
e a lua brilhar no meio dia,
vejo as formas fogosas da folia
desfilando a nudez de todo ano;
mas a bala do revólver traiçoeiro,
mata, ao vivo, meu martelo alagoano.
II
Não desisto, porém,de ser cigano,
nem de amar essa lua tão majestosa,
que invoca a pomba-gira mais formosa
e balança a cabeça de fulano;
vejo nela o desenho de um cubano,
recompondo a magia das bandeiras,
refazendo a risada galhofeira,
do carioca cantor e suburbano;
mas a bala do revólver, traiçoeira,
mata, ao vivo, meu martelo alagoano.
III
Da paisagem sangrenta da favela
brota o samba, invadindo as sesmarias,
e o funk, que detona todo dia,
a princesa do asfalto que é a mais bela;
com seu charme de criança, soberano,
grita a doida falsidade da donzela,
geme o mal, que é das gangs da procela,
abre o colo sedento de baiano;
mas a bala de revólver, tão singela,
mata, ao vivo, meu martelo alagoano.
IV
Pra cantar meu repente e minha glosa,
afilei minha rima incomparável,
e o canto da caipora, inigualável,
explodiu bem em frente a minha prosa;
neste andar de viajante, poeta insano,
destilei minha verve de nortista,
fiz do verso minha arma de artista,
pra viver neste Rio belo e mundano;
nem a bala do revólver, que é arisca,
mata, ao vivo, meu martelo alagoano.